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domingo, 25 de março de 2012

Filosofias do Budo


Filosofias do Budo

O que vem a seguir, é um profundo tratado filosófico sobre esta proposta milenar do budo, baseada em obras de grandes mestres do passado. Tais textos permitem ao leitor, ter um vislumbre de como deve comportar-se um guerreiro diante de uma situação de risco, seja na vida cotidiana ou em competições esportivas por exemplo, através do treinamento físico, mental e espiritual.
  1. Preparo mental
  2. Ki, Shin e Tai
  3. Postura durante a luta
  4. Como olhar durante a luta
  5. Formas de lutar
  6. Desequilíbrio Mental
  7. Gritos de Guerra
  8. Mente em "Ken" e "Tai"
  9. Ouvir o som do vento e da água
  10. A água é o espírito real e o gelo é falso
  11. A vitória completa pode ser sua derrota completa
  12. Vencer com "Ação Energética"
  13. Ato de prudência
  14. Takekurabe
  15. O segredo das técnicas
  16. A importância do treino e seus reflexos
  17. A luta
  18. Quem é bom no zen é bom na luta?


  1. Preparo mental numa luta

O Budo diz: o estado mental deve ser igual ou inabalável na hora da luta como nas horas normais da vida cotidiana. A mente deve ser livre, clara, ampla e equilibrada. Não pode se tornar tensa e nem totalmente relaxada, sem se prender a nada, e sim, calma tranqüila; à vontade, não parando por nenhum instante.
Quando fisicamente se está calmo (parado, estático) a mente deve ser inversa, isto é, em estado de alerta. Quando o corpo está em forte movimento, o espírito deve manter-se calmo, como em dias normais. Evitar que o físico e a mente sejam arrastados ou influenciados um pelo outro. Não se preocupar demasiadamente com seu próprio corpo e nem se distrair ocupando seu pensamento com assuntos banais, mas evitar que o adversário perceba sua meta real na luta. Sua mente não deve se tornar turva, para que possa captar a imagem correta e conduzir o seu pensamento a uma posição mais nobre e instantânea.
Pesquisar cada vez mais no sentido de aperfeiçoar e lapidar o espírito, aumentando cultura e conhecimento. Cultivar a força de vontade, conhecendo o bem e o mal, o correto e o incorreto. Conhecer e assimilar as mais variadas modalidades de lutas e técnicas com a própria experiência, não se deixando iludir. Tudo isto deve ser praticado sempre, para poder corresponder instantaneamente quando for solicitado nas horas de necessidade ou grande ocupação, pois isso não se conseguirá aprender em curto espaço de tempo. 


  1. "Ki", "Shin" e "Tai" - Fortalecer, adquirir e unir três forças

Ki (poder ou força que dá ação ao homem mentalmente). Energia não mecânica.
Shin ou Kokoro (coração ou sentimento)
Tai (força do corpo, inclusive as técnicas).
Ki - É uma qualidade que o homem deve adquirir, da qual origina toda a força e ação. Pode-se também definir como uma energia baseada no controle mental ou psicológico. É possível fortalecê-la infinitamente, com a prática do Budo, auxiliada pela força de decisão.
"Ki" se consegue através de treino consciente, no qual se adquiri confiança e experiência. Quando o "Ki" do homem une-se ao da natureza (leis naturais) surgirá uma força infinitamente grande. O domínio e o uso do "Ki" se consegue ampliar mais que 100% da própria capacidade, possibilitando maior proveito na vida cotidiana, no modo de agir e pensar. A energia hidroelétrica é um exemplo de união entre o homem e a natureza. Miyamoto Musashi quando adolescente, num dos duelos que travou, enfrentou um adversário fortíssimo, profissional de esgrima, conseguindo derrotá-lo aproveitando a queda de rochas como fator surpresa. Este é outro exemplo de união homem-natureza.
"Shin" ou "Kokoro" (sentimentos) - Também se deve observar, utilizar e fortificar os sentimentos, como objetivo de treino. Tentando cada vez mais lapidá-los ao alto grau de formação espiritual.
Na união do "Ki" e do "kokoro" surgem sentimentos naturais: a nobreza, lealdade, coragem, honra, responsabilidade, etiqueta, etc.
"Tai" (corpo) - O corpo deve ser forte, rápido, flexível, resistente, rico em reflexos, assimilando todas as modalidades de técnicas. Uso total do corpo, descarregando as agressividades e tensões nervosas acumuladas.
            O Budo exige muita disciplina durante o período de treinamento, tanto no início, como no término da luta, devendo-se comportar com rigorosa etiqueta em suas normas. Seu treinamento não visa apenas a vitória numa luta ou seu orgulho pessoal e sim um melhor estado físico, uma vida cotidiana mais satisfatória, a preparação para enfrentar qualquer problema.
Durante a luta deve-se encarar com grande importância a distância em relação ao oponente, além da velocidade, técnica e equilíbrio no ataque e defesa, devendo-se adquirir inicialmente, de forma concreta a base ou fundamento correto na sua modalidade esportiva, garantindo assim um bom alicerce em sua formação.  


  1. A postura durante a luta

Falando em postura, alguns mestres observaram durante a luta o comportamento dos animais selvagens e concluíram, por exemplo, que um gato quando enfrenta um adversário, curva a coluna, demonstrando sua aparência bem maior, para impressionar o oponente e proteger-se contra agressões.
Segundo Musashi, o homem é um ser superior e diz o seguinte: "kamae" existe, mas também deixa de existir, portanto, não é recomendável ficar preso ou ocupado com uma posição, pois o objetivo é derrotar o adversário e a sua técnica. Deste modo pode-se dizer que existe ou não Kamae, pois se altera de acordo com o oponente, o local, a situação, podendo ser tomada a forma mais adequada e não perder o objetivo principal, que seria derrotar o adversário. Portanto, havendo a necessidade de utilizar maiores variedades de ataques e contra-ataques, não se prender a isto e sim fixar o pensamento num único objetivo, que é a maneira para dominar o oponente. Sem isso, nunca poderá derrotá-lo.
Diz um provérbio sobre treinamento: "Hoje venci o  eu de ontem. Amanhã vencerei o meu interior e no futuro vencerei o meu superior".
"Kamae" - formas ou posições de lutar que cada lutador possui e já conhece. No entanto, qual seria a posição ideal? - Musashi diz o seguinte: seu rosto deve manter-se firme, a cabeça é o centro de gravidade do corpo, deve-se manter equilibrado, sem abaixar ou erguer, sem torcer ou inclinar. Seu olhar é firme, cujo movimento deve ser calmo e estável. Não é recomendável contrair a testa exibindo rugas, admitindo-se estas entre as sobrancelhas e ao início da linha do nariz. As vistas devem piscar menos e diminuir o angulo de abertura dos olhos. Sua fisionomia é tranqüila, a linha do nariz normal, contraindo levemente o pescoço para endireitar a posição da cabeça; do ombro até ao longo do corpo seus tônus ou tonificações musculares são uniformes.


  1. Como olhar durante a luta

SEUS OLHARES DEVEM SER AMPLOS E MAIORES EM TODOS OS SENTIDOS.
"Kam" significa ver o "conteúdo" e será observado em primeiro lugar para notar a real qualidade das coisas. Depois vem "Kem", que significa olhar seus movimentos superficiais ou estéticos.
Olhar, ler e compreender superficialmente os movimentos distantes e observar, enfrentar e saber os objetivos reais dos movimentos próximos. Ver e entender o "conteúdo", evitando a influência das atitudes estéticas ou aparências. Nas lutas de mais de um adversário, deve se olhar os lados e arredores, sem movimentar os olhos.
Busque resolver os problemas mais necessários em primeiro lugar, sem esquecer dos secundários. Na movimentação ou na forma de execução, não estacione ou pare. Existem sentidos e valores que progridem e se alteram. Quando parar significa a morte, não parar significa a vida. A água em movimento não estagna nem putrefaz. Qualquer treino deve ser pesquisado continuamente possibilitando alterações e progresso.


  1. Formas de lutar

Assim, através dos treinos, adquirir e assimilar as cinco formas de luta e todas as técnicas. O corpo aumenta sua flexibilidade, toma decisões corretas e obtém o ritmo certo, facilitando os reflexos e impulsos. No inicio, vence um adversário, depois dois, três e muitos outros, aprendendo o certo e o errado na luta e, gradativamente, começando a perceber seu real objetivo.
Não se deve apressar e nem precipitar nos treinos e sim conhecer vários tipos de adversários, inclusive o preparo mental deles, alcançando essa meta com as próprias experiências vividas.


  1. Desequilíbrio Mental

São várias as causas da perda de equilíbrio mental: trauma psicológico, no caso de perigo, situações imprevistas, dúvidas, emoções descontroladas, acidentes, medo, etc. que podem influenciar o adversário e também a si próprio. Portanto, é muito importante, principalmente durante uma luta, enfrentando o oponente a frente, a exigência e necessidade do maior controle do seu estado psicológico. Aquele que conseguir esse controle perante seu atacante, já terá uma grande vantagem, possibilitando uma vitória com relativa facilidade. Assim, para abalar o estado mental do adversário é preciso citar situações, como golpes falsos, etc., utilizando ao máximo os recursos e conhecimentos adquiridos através de pesquisas profundas, as quais são necessárias. Conseguindo desequilibrar psicologicamente o adversário, este se torna inseguro e abalado, perdendo o controle físico.


  1. "Kiai" (Gritos de Guerra)

O 'Kiai' pode ser aplicado em três momentos: inicial, durante e final. Os gritos de guerra servem para aumentar, acelerar e expor a força de ação do homem. Portanto podem ser aplicados contra incêndios, vendavais e as fortes ondas marítimas, para criar coragem e energia para enfrentá-los.
Na luta individual, para colocar o adversário em movimento, o grito antecipa os golpes. Não é necessário utilizar o grito, simultaneamente com os golpes. No decorrer da luta, ele servirá para incentivar numa situação, numa onda quente a correnteza da vitória (e este também é baixo, forte e profundo). Usa-se também como agente animador numa torcida. Deve-se tomar precauções ao gritar, pois se o grito for usado fora do ritmo e tempo ou em ocasiões impróprias, poderá surgir como contra efeito, tornando-se prejudicial.


  1. Mente em "Ken" (ataque) e "Tai" (defesa)

"Ken", significa atacar violentamente e vencer com enérgica iniciativa, isto é, como uma explosão total de forças.
"Tai", esperar o ataque do adversário, mas com bastante precaução, estando física e mentalmente pronto para o mesmo, refletindo instantaneamente e não apenas para defender-se logo. Neste caso, o reflexo deve ser como "antecipar a iniciativa do ataque do oponente".
Pode-se colocar o corpo em "ken" (ataque) e a mente em "Tai" (defesa), ou vice-versa. Isto pode ser chamado como alternância da mente e do corpo em Ken e Tai. A razão disto está em não deixar que a mente e o corpo estejam em Ken (ataque), porque surgirão algumas falhas no descontrole de um deles. É como se fosse um automóvel com excesso de velocidade e o motorista em estado mental agitado, havendo assim uma grande possibilidade de perigo. Sendo ao contrário o corpo e a mente em Tai, simultaneamente, a luta tornar-se-á monótona e será surpreendido pelo adversário, o que também não é recomendável. Então o ideal seria o controle harmonioso entre o corpo e a mente sempre em alternância.


  1. Ouvir o Som do Vento e da Água

O homem pode se dividir em duas partes: parte externa ou superficial e interna ou mental. O controle ideal seria semelhante ao do Texto anterior, mas também pode dizer-se que, para um lutador, sua parte externa deve colocar-se em estado calmo e a parte interna em estado dinâmico e ativo.
Yagyu Tajimano kami diz: "O vento em si não emite nenhum som. Mas, se vier a soprar mais baixo e em contato com diversos tipos de obstáculos, emite vários tipos de sons. A água quando cai, não tem som, mas ao chocar-se contra algum obstáculo, produz diversos sons. Assim, deve-se reagir calmamente de acordo com as circunstâncias e necessidades. Deve-se manter a calma superficialmente, porém, no interior deve-se se estar em ação para se aprimorar."
No Budo, o corpo em movimento nervoso não é recomendável e também se deve evitar a influência mental pela movimentação superficial.
Existem os termos IN, que se pode traduzir como pólo negativo, lua, noite, dorsal e YOU, pólo positivo, Sol, dia, facial. Ambos são necessários para compreensão de tudo que nos cerca. Devem ser ajustados equilibradamente, simultaneamente com a sua parte externa e interna do corpo. Quando a sua parte interna for YOU (ativa), a parte externa é IN (calma) ou vice-versa, deverá sempre haver um equilíbrio entre a mente e o corpo.
O "Ki" pode ser expresso na alegria, no estado de atenção, de alerta de vontade, nos anseios, etc. e assim se pode trabalhar com o KI (energia de ação) em grande uso no seu interior e com cuidado e precaução no exterior ou, no interior calma e exterior ativo. Expondo o KI desse modo, tudo isso deve ser natural como o amanhecer e o anoitecer.
Assim, Ken (ataque), Tai (defesa), Dou (movimento) e Sei (parado) devem ser ajustados harmonicamente e alternadamente no seu interior e exterior do corpo ou inversamente.
Um pássaro d'água que flutua sobre a mesma, aparentemente está calmo, mas por baixo da superfície da água está utilizando cuidadosamente suas patas a procura de iscas. Existem duas faces opostas chegando à perfeição, cujo trabalho do corpo no seu íntimo e no exterior se torna uma ação conjunta, perfeitamente livre e espontânea. Jubei Yagyu analisando o provérbio acima citado, diz: "Durante a luta tenha sua mente tranqüila consigo mesmo, até possa ou consiga ouvir o sussurro do vento e da água."


  1. A água é o espírito real e o gelo é falso

O espírito real quer dizer: conseguir vencer, analisar e agir de modo correto do seu estado mental normal, o que não fica preso a qualquer coisa.
O espírito falso, ao contrário, se torna preso a um pensamento isolado. Agora, se seus espíritos reais se concentrarem apenas num lugar, tornando-se sólido, transformar-se-ão em espíritos falsos. Deste modo, não poderá reagir naturalmente contra os diversos tipos de problemas que surgem ao redor.
A água e o gelo são semelhantes, mas não iguais, pois com o gelo não se pode lavar. Derretendo-o e permitindo que se escoe livremente em todas as direções, torna-se então utilizável.
Com a mente acontece o mesmo, não se deixar prender, pois ficando sólida, perde a flexibilidade e não poderá ser utilizada. Derretendo-a e permitindo que se escoe por todo seu corpo, onde quer que seja, em todo lugar, livremente, assim se pode dizer que é o espírito real. Quando a mente fica presa por uma flor vermelha, esquecendo-se do tronco, raízes e folhas, perde-se a visão do conjunto. O homem, às vezes, refletindo sobre seus atos, logo percebe porque estava tão nervoso e descontrolado por assuntos tão banais. Isto quer dizer que a mente estava presa e sólida.





  1. A vitória completa pode ser sua derrota completa

Existe um provérbio que diz: "Conhecendo-se o adversário e conhecendo-se a si próprio, pode se lutar cem vezes que não haverá perigo. Não conhecendo o adversário, porém conhecendo-se a si, às vezes se pode ganhar ou perder. Mas, se não se conhece o adversário e nem a si próprio, nunca se conseguirá vencer."
É necessário admitir corajosa as próprias falhas o que poderá ser a causa da derrota. Não exceder sua capacidade e nem se rebaixar. O excesso de orgulho e outras falhas acontecem devido à falta de visão realista, coragem e cultura. É preciso conhecer o seu "eu" fraco e o forte para adquirir a vitória.


  1. Dominar com "Iguem" (Kuraidori) e vencer com " Ação energética" (Ikioi)

"Iguem" ou "Kuraidori" significa que o homem domina o adversário não pela técnica da luta e nem pela força, mas sim por uma espécie de energia irradiada que se manifesta pelo grau de formação espiritual, cultural e do caráter do indivíduo. "Iguem" não se altera por influência externa ou circunstâncias, porque isto é uma qualidade adquirida do homem.
Com o "Iguem" e uma vez que o individuo tomou a posição de luta (kamae) que é a posição realmente perfeita, exercendo uma pressão dominadora contra o oponente, sem a necessidade de movimentos, sua atitude nunca será influenciada ou abalada pelos movimentos adversários.
"Ikioi" é um movimento ou ação bastante forte e esmagadora, além de dominadora, contra o adversário.
"Iguem" é calmo, mas no íntimo contêm mil variações e alterações de reflexos, prontos contra qualquer tipo de ataque do adversário. Junto com o movimento "Ikioi", cuja ação é esmagadora, anula as mil tentativas do oponente.
Assim diz-se: Enfrente o adversário com Iguem e vença com o Ikioi. São as duas coisas num objetivo só. Dentro de Iguem, contém Ikioi e vice-versa. Quando apresentar Iguem forte, não temerá o oponente e nem terá dúvidas de si próprio.
  1. Ato de prudência e seu procedimento diário

Para expor com perfeição toda capacidade de conhecimento, deve-se agir de modo prudente, habitual e constante, em qualquer circunstância. A maioria das técnicas, atos fenomenais e lendários transcritos, foram baseados na dedicação e seu melhor controle mental e não com o auxílio de milagres. Mesmo possuindo técnicas fenomenais, caso for surpreendido numa hora de distração, não conseguirá realizar um trabalho consciente. Portanto, na hora de sentar-se, verifique discretamente ao seu redor, em todos os sentidos e direções, de modo a prevenir-se contra qualquer incidente. Também, quando estiver perto de uma porta, observar cuidadosamente, preparando-se contra o perigo.
Assim como no exemplo citado acima, deve-se ser prudente no modo de agir, de proceder, preparando-se física e mentalmente para estar apto a qualquer situação, através do seu treino e prática constante. Só assim conseguirá uma reação satisfatória em qualquer ambiente.
Para uma pessoa bem treinada no seu modo de proceder, com o olhar, pode transformar seu olhar em um golpe que se denomina "Mitsume", isto é, um olhar relâmpago e dominador, em que o adversário perde suas reações e reflexos, sendo que, esta falha, numa fração de segundo, poderá ser uma das causas de derrota. O gato, com seu olhar, consegue paralisar o rato e este esquece-se das pernas para fugir, preocupando-se com o olhar fulminante do gato. Os acontecimentos imprevistos podem ser diabólicos e fatais, apresentados sob mil variações e quem não estiver preparado, mesmo possuindo boas técnicas, poderá falhar na união da técnica, mente e corpo que refletem inconscientemente as suas capacidades com perfeição.


  1. Takekurabe

Takekurabe significa aferição de altura. Isso explica o ato de aproximar-se ou chocar-se contra o adversário, para evitar tomar uma postura rebaixadora. Em qualquer situação, para penetrar no adversário, é necessário que o corpo se alongue, se estenda ao todo, que fique mais solto, à vontade, cheio de reflexos, evitando que se torne encolhido ou espremido. Assim, deve-se enfrentar o adversário, corajosamente, frente a frente, dominador, exercendo pressão no adversário e com força, como se fosse numa aferição de altura.


  1. O segredo das técnicas

A luta não é magia, portanto, não há necessidade de esconder certas técnicas, fazendo segredo. O bom método seria transmitir as técnicas mais fáceis de assimilar, evoluindo para as mais difíceis, juntamente com as teorias mais simples de adaptação e, pouco a pouco, de acordo com o progresso do indivíduo se aprofundando nos assuntos mais complexos. Na luta, às vezes, é melhor utilizar as técnicas fenomenais, não só por aquele que está com o nível técnico em condições de entender do assunto e ter capacidade para utilizá-las com grande aproveito, como por aquele que já é um mestre.
No Budo, o mestre pode se orgulhar, mesmo que ensine tudo que conhece. Ninguém consegue superá-lo porque existe constante progresso e aprimoramento entre professor e o aluno. Não merece respeito, aquele que leva o budo, exibindo aos leigos os seus mil e um manejos, impressionando-os. O budo não é show, portanto deve ser modesto e servir para o aperfeiçoamento de algo mais na formação de sua personalidade. Possuir bons princípios e confiança, evitando tomar o caminho malévolo e a autodestruição conseqüentemente.


  1. A importância dos treinos e seus reflexos

Existe uma tendência no campo esportivo de que as teorias antecipam-se às praticas em geral. As posições de lutas são mais fáceis de assimilar do que as movimentações na luta. Estas tendências ocorrem principalmente quando o adepto tenta se aperfeiçoar fugindo de sua prática e permanecendo longe das experiências vividas.
Os reflexos e as técnicas instantâneas não nascem com os pensamentos ou cálculos e sim através do fenômeno natural  que é a maior repetição e a sedimentação constante dos treinos e estes se revelam de um modo mais econômico e perfeito contra diversas formas e tipos de ataques. O treino deve objetivar a vitória, descobrir o caminho real da vida e com persistência no treino, o corpo adquire suas teorias. Através dos treinos, atingindo certo nível, consegue-se diminuir os problemas e tensões que abalam a mente, que trabalham em conjunto e unidade.
Os movimentos na luta tornam-se automáticos e inconscientemente reagem contra qualquer situação em que se encontrem de modo tranqüilo. Toda esta automatização se adquire com o aprimoramento da pesquisa no treino e a dedicação, conseguindo ultrapassar seus ensinamentos, atingindo então o "Satori" (perfeição, iluminação) que não se aprende através de ensinamentos e isto se descobre com o próprio corpo.
Então surge a dúvida - como deve ser o seu treino para que as teorias não se antecipem às práticas? Isto, Yagyu esclarece através da denominação - "grau da lua e da água" (Suiguetsu-no-Kurai). A Lua reflete na água em diversas formas, por motivos de muito tipos de ondas influenciadas pelo ambiente, mas a imagem real é única. O indivíduo bem formado e equilibrado, mesmo de um ambiente sujo, não se contamina, em perfeito estado. É como uma jóia bem lapidada que mesmo dentro da lama, não perde o brilho. Porém, uma pedra não lapidada, a sujeira e a poeira facilmente aderem a ela. manter o estado mental em "Mushim", quer dizer não ficar escravizado por interesses e idéias confusas e também de mau conceito mental.
Não se define a imagem real do estado mental mas, pode concretizar-se, exemplificando como a água que não possui forma definida, se situando em qualquer recipiente, quer seja redondo ou quadrado, livremente. Não se deve preocupar somente com um conteúdo de treinamento. Assim nos golpes a aplicar, acompanham as técnicas, para as quais participam suas leis e princípios fundamentais. A força mental é a origem das técnicas e a forma ou base de lutar é a origem dos movimentos nos golpes. Através da lealdade consigo mesmo, consegue-se adquirir a vitória, mas com o engano e malandragem, a vitória vem raramente. Não se deve progredir com teorias emprestadas, fugindo das próprias experiências que vive.




  1. A Luta
           
Um estilo explica: quando enfrentar o adversário seriamente, em frente, surgem duas faces na mente. Uma é para vencê-lo e dominá-lo, outra é o medo tentando fugir da situação, pois a outra é uma coragem falsa e imposta. Aceitar esta realidade e treiná-la para fortificá-la cada vez mais se faz necessário para ter o domínio perfeito das técnicas, inclusive o seu físico. A essência do budo é utilizar ao máximo o trabalho fenomenal da mente, pesquisando-a, sedimentando-a gradativamente para o melhor.
Um cego aproxima-se da cobra sem medo, pois ele não a vê e não conhece o perigo. No início do treino, surge uma etapa em que se enxerga o medo e não consegue se movimentar, mas com persistência, ultrapassando essa barreira, aprende-se a se afastar do perigo.


  1. Quem é bom no zen é bom na luta?

Seus objetivos são distintos, mas muitos falam de seu relacionamento e se confundem. Zen é para ultrapassar o mundo da vida ou da morte, para adquirir a paz espiritual ou mental, conseguindo assim a mente clara e o bom raciocínio, anulando todos os problemas que nos cercam. Deste modo, estando numa situação, no meio de mil adversários, mesmo o seu corpo sendo triturado, consegue manter o estado mental consciente. Mas este estado mental não serve para livrá-lo da morte. Mas, sim, para não temê-la.
Portanto, a diferença no budo seria afastar ou defender-se da morte com autoconfiança. Assim, o estado mental em equilíbrio pode enfrentar e resolver os problemas de modo mais conveniente e útil para si.
Concluindo, só o treino mental não basta, é necessário fortalecer a técnica através do corpo, evitando desta maneira, a influência maléfica. Assim a mente nunca será ameaçada.



[1] Organizado por Wanderley da Silva